sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Alguns Livros para trabalharmos em Sala de Aula

O Livro "Sete patinhos na lagoa", de Caio Riter (Biruta), traz um texto menos próximo da oralidade - como é comum nesses livros de contar e nos tangolomangos - apesar das rimas e estrutura em versos, meio em quadra. A narrativa é mais rebuscada, a linguagem escrita bem trabalhada,  com vocabulário mais denso, e traz várias ações entre uma engolida e outra dos patinhos pelo jacaré. Assim, se distancia mais da estrutura de tangolomango, mas continua tendo a ideia de enumeração decrescente. Tem belas imagens, do ilustrador Laurent Cardon. 

Da escritora Anna Flora, tem o livro “Cada macaco no seu galho”, da coleção “Macaco Disse”, com ilustrações de Claudio Martins (Formato). Se cada macaco tem seu galho, imagine quando os galhos são cortados...o livro não deixa de dar seu recado nesse sentido ecológico. Além do próprio texto na estrutura de tangolomango, o livro traz um glossário com diversas espécies de primatas e páginas com brincadeiras para cortar, colar, montar.

Em “Números Assombrados”, de Flávia Muniz (Girassol), gostei do fato de os personagens serem da turma dos monstros, do terror. Terror engraçado... Eles passeiam de trem fantasma e a cada momento vai descendo um, por algum motivo. No fim, quando restam dois – surpresa! – só lendo para ver, mas o trem fica lotado!!! Uma saída diferente... 

Meu filho ganhou um livro que se chama “Os dez monstrinhos”. Não é brasileiro, é inglês, mas foi editado aqui pela Lafonte. É bem infantil e já desconfio logo, pois não traz o nome do autor, que descobri na internet, Sally Hopgood. O livro é daqueles que têm furos nas páginas cartonadas e, nesse caso, pelos furos vemos os olhinhos dos monstros. E a cada virada de página, um se esconde. 

Começa assim: “Dez monstrinhos estão escondidos no meu quintal. Eles não sabem se esconder muito bem, então encontrá-los não será difícil!”.  Eles vão desaparecendo aos poucos, vão sendo vistos sempre um a menos e, no final, reaparecem num pop-up, como presentes numa caixa. Não tem lá nada de muito especial, mas me pareceu legal para as crianças bem pequenas, pela linguagem, o tipo de sumiço e o reaparecimento efusivo do final.

Gente, dia desses vou fazer um post de livros de monstros, é tanta coisa!!!

Através da pesquisa que fiz desse livro, descobri que em inglês tem muitos livros assim – e muitos começam com cinco! São livros de “countdown”, ou seja, de contar de trás pra frente, de dez ou cinco para zero. Não dá para saber se todos os livros de contagem que vi são de estrutura enumerativa decrescente, mas já dá para notar que ela também aparece em produções de países anglofones. Há muitos livros desse tipo, de contar de um a dez, de dez a zero, ou para frente e para trás. 

Alguns desses foram editados em português, sempre com esse formato de papel cartonado, furos, os bichinhos se encaixando nos furos, e terminando em pop-ups – que os pequenos adoram! Como exemplo, cito os “Eram dez largartas” (ou cinco), “Eram dez girinos” e a versão “Eram cinco girinos”, todos assinados por Debbie Tarbett (Ciranda Cultural). São para os pequenos. Começam com dez ou cinco, vão sumindo página a página, concretamente, de seus buraquinhos... Ou seja, parece que, ao menos na Inglaterra, essa estrutura é muito usada em livros próprios para crianças menores. 


Sem contar aquela cançãozinha enumerativa dos dez indiozinhos, que aprendi na versão em inglês, quando menina e morava na Inglaterra, que vai de um a dez e depois, decrescente, de dez a um, como vocês podem ver aqui. Como essa, com a mesma melodia, tem “Ten red apples e “Ten little apples”, a canção e vários livros, e por aí vai...

Falta ainda referir-me a um livro de Ângela Lago – escritora e ilustradora que aprecia muito os tangolomangos – chamado “A visita dos 10 monstrinhos” (Companhia das Letrinhas). Monstros, justamente! De novo eles!

Na verdade, não se trata de um tangolomango, pois não é uma contagem decrescente, mas de algum modo, flerta com essa estrutura. Os monstrinhos vão chegando, um a um, com rimas e jogos de palavras: “veio um, paratibum...e dois vieram depois. Chegaram três de uma vez... e quatro entraram no quarto”. E eles vão fazendo a maior confusão! Na ilustração, cada algarismo tem dentro de si o número de monstrinhos correspondente a ele e tem muitas outras sutilezas escondidas entre texto e imagem. É um livro legal para os pequenos, que estão aprendendo os números. Mas não é tangolomango...

Ah! Aliás, outra de números, mas que também não é decrescente é a brincadeira cantada da Tumbalacatumba: “tumbalacatumba, lacatumba laduê”... “Quando o relógio bate à uma...”, também chamada de Dança das caveiras... Para dicas de outros livros de contar, não necessariamente com estrutura enumerativa decrescente, veja esse post aqui, muito interessante. 

Mas voltemos aos tangolomangos...

Bom, como eu disse, e falando nela, Ângela Lago gosta dos tangolomangos e no seu site propõe um Tangolomango dos ETs. Ela diz fazer coleção de tangolomangos e pede que quem saiba um, envie para ela! Vejam

Por fim, vi recentemente uma espécie de tangolomango no livro “Ciranda Brasileira”, de Elias José (Paulus), no qual ele traz poemas e cordéis a partir de xilogravuras de J. Borges. Um deles é “O namorado matuto”, em estrutura de tangolomango – embora a expressão não apareça. O matuto tinha dez namoradas e foi perdendo cada uma de um jeito, até restar nenhuma e ficar “chupando o dedo”. Diferente, porém do que acontece geralmente nos tangolomangos, suas estrofes não trazem rimas. Mas a repetição de “só fiquei com x namoradas”, a cada vez, confere um ritmo ao poema.




Apropriações do tangolomango



Os textos da tradição oral tem sido uma rica fonte para os autores de literatura infantil criarem suas obras, sejam narrativas ou poéticas. Contemporaneamente, a literatura infantil ganhou muito em beber na fonte da tradição oral no que diz respeito a um ludismo gratuito, à escrita atravessada pela oralidade e às sonoridades que lhes são próprias. Muitas vezes o diálogo com essas fontes tomam ares de intertextualidades mais atestadas mesmo, quando parlendas, cantigas, trava-línguas, adivinhas, quadrinhas, acalantos, são retomados de modos diversos nas recriações dos autores. É comum os autores resgatarem brincadeiras orais da cultura popular para as páginas de seus livros ilustrados. Esse é o caso também dos tangolomangos. 

É importante, no entanto, saber selecionar bem os bons textos, as boas reapropriações, pois há igualmente muita produção no mercado editorial que apenas repetem fórmulas já consagradas, juntando-as a ilustrações por vezes sem muita qualidade, sem ressignificar e recriar, de fato, esses textos que usam como fonte, seja com as modificações que introduzem, seja no diálogo que estabelecem com as ilustrações. O bom senso é uma ótima bússola, mas há também que olhar os autores envolvidos, o cuidado com a edição e ilustração, enfim, uma série de critérios que possam nos ajudar a separar o que realmente vale à pena.

O tangolomango - ou a sua estrutura versificada, enumerativa decrescente, essa parlenda mnemônica de contar para trás - é revisitado e utilizado em diversos livros atuais, dentre os quais indicamos alguns. Os autores aí reinventam a brincadeira tradicional do tangolomango, cada um ao seu modo. Cada um traz a sua versão, com sua maneira própria e especial de contar a história desse sumiço gradativo. A palavra tangolomango pode estar ou não presente nessas parlendas reinventadas. O que vale ressaltar é a presença de elementos básicos desse tipo de estrutura: o número de estrofes, os versos rimados e ritmados, a enumeração decrescente...

É interessante que em muitos desses livros, no final, algo acontece, de mágico ou não, e os personagens voltam a ser dez...ou mais... Será porque poderia ser um pouco triste para as crianças terminar com todo mundo desaparecido? Será que a ideia subtrativa, de sumiço, que remete à morte, ao vazio, à doença, à solidão, seria considerado muito frustrante para os pequenos? Talvez! É uma possibilidade que, sendo para crianças, prefira-se apresentar uma redenção, um recomeço, um desfeitiço, uma volta populosa dos personagens quase perdidos... Assim como, no geral, nessas apropriações do tangolomango parte-se de dez,  e não de nove, parece que não se quer terminar em zero...em nenhum... Mas às vezes termina...

Alguns desses textos apresentam motivações tão pouco próximas aos tangolomangos tradicionais, a sua natureza mágica ou mórbida, que poderíamos até questionar se podemos nos referir a eles como tangolomangos ou se são simplesmente textos enumerativos decrescentes... Não sei...Afinal, o princípio de numeração regressiva está presente em rezas e textos muito diversos, não necessariamente tangolomangos, mas, por outro lado...os tangolomangos bem podem "esquecer" a sua origem mesmo, como vimos no post anterior, não é? 

Bom, mas vamos às sugestões! 

Começo com “Chá das dez”, de Celso Sisto (editora Aletria). O livro conta a história de dez velhinhas, bem arrumadinhas, que saíram juntas para um chá. Mas, até chegar ao destino, elas passam por várias situações corriqueiras e... “Dez, nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três, duas... Só uuuma? Então, que tal tomar um chá, com uma só velhinha...?” – lê-se na contracapa. O autor não usa a palavra tangolomango, mas a estrutura é completamente similar aos tangolomangos. No final, como as situações dos sumiços não eram irreversíveis, as velhinhas voltam a ser dez! Ver site doautor. E você pode ler a história aqui. 

No livro “A casa das dez furunfunfelhas”, de Lenice Gomes (editora Mundo Mirim), a trama já é mais retrabalhada, pois cada velhinha furunfunfelha, na sua vez, diz um trava-língua e isso causa o tangolomango nelas. Aqui a palavra tangolomango, de fato, aparece, bem como o sentido de feitiço que ela evoca. Elas são enfeitiçadas, uma a uma e, depois, para acordá-las, só com adivinhas. O velho Félix, com seu fole e suas adivinhas, consegue trazer todas de volta do tangolomango... e salva as dez irmãs! Assim, além do tangolomango, o livro traz outros gêneros da tradição oral no texto.

No livro Dez Sacizinhos”, de Tatiana Belinky (Dobras da Leitura), os sacis saem da mata e se espalham pela praça, passam debaixo do arco-íris, nadam na praia e andam de fusca, bem danadinhos, urbanos, brincalhões. Um a um, vão  todos saindo de cena. E se esconde na paisagem (mas não muito) alguém que a gente não sabe se tem a ver com o sumiço ou não. Quem será?  

O livro “As dez filhas do seu João”, de Fábio Sombra (Abacatte Editorial), foi ilustrado pelos tapetes do grupo Costurando Histórias, que também os usam em suas contações. Olha um aí abaixo:


Veja o site do autor e o do grupo.  

O autor diz ter revisitado o tangolomango de origem portuguesa, As Marrafinhas, que na verdade se inicia com 24 Marrafinhas, caem para 12 e daí vai decrescendo uma a uma através do “tangomango”. Para mim, é um tangolomango como outros...Ver uma versão das Marrafinhas aqui. 

O livro “Os dez patinhos”, escrito e ilustrado por Graça Lima (Companhia das Letrinhas), conta as estripulias de dez patinhos irmãos que não param quietos. Cada vez um se distrai com alguma coisa e sai de cena. E no final, quando reaparecem, cadê o décimo patinho? 

É um livro bacana para crianças pequenas, pois além da linguagem, dos personagens, das motivações dos sumiços dos patinhos, bem apropriados a crianças menores, mostra uma comparação da quantidade de patinhos e traz também, no final, um jogo de trilha, de tabuleiro, com os patinhos disputando para ver quem vai chegar primeiro.



Um livro que traz a expressão tangolomango é o “Tangolomango da Massa”, de Aléxia Linke e Tana Halú, livro de produção independente desses autores de Roraima, que tive a chance de ler e ter, graças a minha amiga Leuda Evangelista, da Universidade Federal de Roraima, que, sabendo da produção desse post, quando estávamos em um Encontro do Trilhas aqui na Bahia tinha, por acaso, alguns exemplares em mãos! Que coincidência, heim? Valeu, Leuda!

Aléxia traz uma adaptação do tangolomango popular tradicional, mas no fim – como em alguns livros já citados – a situação se inverte e os personagens voltam de seus tangolomangos intactos! O diferencial desse livro é que as ilustrações foram todas feitas com massa de modelar, por Tana Halú.

Um livro que traz essa repetição por subtração própria aos tangolomangos, mas sem ser tangolomango de fato, é o livro Eram Cinco, de Ernst Jandl, escritor austríaco, lançado no Brasil pela Cosac Naify. Fala de cinco brinquedos numa sala de espera, cada qual com sua mazela e, de um a um, vão entrando e saído, cada vez um a menos, que restam esperando o atendimento atrás daquela porta de onde sai uma luz... 

Outro desse tipo, muito legal, é o "Dez numa Cama", de Penny Dale (Edições Asa, Portugal). Um menino numa cama apertado com um monte de seus bichinhos, vai chegando para lá e cada vez um cai.  Baf, tumba, bum, pim, crás, e vão caindo todos os animais. Cada vez que um cai, uma onomatopeia, o que é muito interessante, tanto para dar colorido à leitura da história, quanto para pensar nos sons e sua grafia. No fim, o menino fica só e quer todos de volta na cama... Dica bacana de minha amiga e parceira, fiel escudeira de sempre, Ana Antunes. Valeu, Aninha!

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